Uma antiga luta dos consumidores de serviços médico-hospitalares chega ao fim.
A exigência ilegal de cheque caução (ou documentos análogos) em situações de emergência agora é tipificada como crime.
A correta conduta deveria ser, primeiro o atendimento e depois o pagamento. Primeiro, salva-se a vida e depois discute-se quem paga a conta.
É óbvio que o fornecimento de serviços médico-hospitalares têm custo e não é de interesse nacional que bons hospitais que prestam serviços de qualidade fechem suas portas por conta de "calotes", mas esse é um risco inerente aos negócios em geral. Os serviços de saúde privados de qualidade já haviam abolido essa prática.
Lembrando que a exigência ilegal do cheque caução do ponto de vista do Direito Civil configura um vício da vontade. O conceito de Estado de Perigo está expresso no Código Civil Brasileiro em seu art. 156, verbis:
“Art. 156. Configura-se o estado de perigo
quando alguém, premido da necessidade de salvar-se, ou a pessoa de sua família,
de grave dano conhecido pela outra parte, assume obrigação excessivamente
onerosa.”
Explica Maria Helena Diniz:
“NO ESTADO DE PERIGO HÁ TEMOR DE GRAVE DANO
MORAL (DIRETO OU INDIRETO) OU MATERIAL INDIRETO À PRÓPRIA PESSOA OU A PARENTE
SEU, QUE COMPELE O DECLARANTE A CONCLUIR CONTRATO, MEDIANTE PRESTAÇÃO
EXORBITANTE. O lesado é levado a efetivar negócio excessivamente oneroso em
razão de um risco pessoal (perigo de vida, lesão à saúde, à integridade
física ou psíquica de uma pessoa: o próprio contratante ou alguém a ele ligado)
que diminui sua capacidade de dispor livre e conscientemente. A PESSOA
NATURAL, PREMIDA PELA NECESSIDADE DE SALVAR-SE, A SI PRÓPRIA OU A UM FAMILIAR
SEU DE ALGUM MAL CONHECIDO PELO OUTRO CONTRATANTE, VEM A ASSUMIR OBRIGAÇÃO
DEMASIADAMENTE ONEROSA. POR EXEMPLO, VENDA DE CASA A PREÇO FORA DO VALOR
MERCADOLÓGICO PARA PAGAR DÉBITO ASSUMIDO EM RAZÃO DE URGENTE INTERVENÇÃO
CIRÚRGICA, POR ENCONTRAR-SE O PACIENTE EM PERIGO DE VIDA. (...)”
(DINIZ, Maria Helena, Código civil anotado.
São Paulo: Saraiva, 2004. p.170).
É nesse mesmo sentido a opinião do professor Natanael Sarmento, a seguir
transcrita:
“Como se pode observar, no estado de perigo
alguém sofre um temor fundado ante a ameaça de grave dano e por esta razão
assume compromissos ou faz declarações exorbitantes de vontade. O risco
representado pelo perigo de não salvar a si mesmo, ou a algum familiar ou não
familiar, observada a ressalva do parágrafo único, é a causa determinante do
negócio jurídico, em que a pessoa se obriga a contratos draconianos. A fim de escapar
do perigo – e a ordem legal não exige esse tipo de sacrifício das pessoas -, o
agente celebra um acordo excessivamente oneroso. NÃO FOSSE A CIRCUNSTÂNCIA
DO ESTADO DE PERIGO, OU SEJA, O RISCO DE NÃO CONSEGUIR SE SALVAR OU DE
SALVAR ALGUÉM DA FAMÍLIA, DECERTO O CONTRATANTE NÃO PACTUARIA; EM SUMA, O
CONTRATO NÃO REPRESENTA UMA VONTADE LIVRE DA PARTE.” (SARMENTO, Natanael, Notas
de direito civil, parte geral. São Paulo: Harbra, 2004. p.175)
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Acresce o art. 135-A ao Decreto-Lei no 2.848, de 7 de dezembro de 1940 - Código Penal, para tipificar o crime de condicionar atendimento médico-hospitalar emergencial a qualquer garantia e dá outras providências.
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A PRESIDENTA DA REPÚBLICA Faço saber que o Congresso Nacional decreta e eu sanciono a seguinte Lei:
Art. 1o O Decreto-Lei no 2.848, de 7 de dezembro de 1940 - Código Penal, passa a vigorar acrescido do seguinte art. 135-A:
Art. 135-A. Exigir cheque-caução, nota promissória ou qualquer garantia, bem como o preenchimento prévio de formulários administrativos, como condição para o atendimento médico-hospitalar emergencial:Pena - detenção, de 3 (três) meses a 1 (um) ano, e multa.Parágrafo único. A pena é aumentada até o dobro se da negativa de atendimento resulta lesão corporal de natureza grave, e até o triplo se resulta a morte.”
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